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domingo, 7 de maio de 2017

Down também ama

? Antes de discorrer especificamente sobre a legalidade do casamento de portadores da Síndrome de Down, é preciso frisar que a nova lei sancionada em julho de 2015 é motivo de divergência e constantes discussões doutrinárias. E o foco da discussão reside principalmente na capacidade de discernimento do portador de deficiência mental. Inobstante a nobreza do escopo desta norma, o seu pretenso alvo de tutela foi, em verdade, o principal prejudicado.

Para alguns doutrinadores a mesma veio de fato mudar a concepção que se tem sobre o deficiente, até porquê vive-se um momento de inclusão social, em que a sociedade clama por direitos iguais, sem diferenciações ou privilégios mais igualdade.

Olhando por esse ângulo, os que a defendem veemente afirmam que a mesma se trata de uma evolução do direito nos últimos tempos, pois em seu bojo, a mesma traz consagrado o princípio constitucional da isonomia, o qual vem garantir que todos sejam tratados de modo igualitários, não havendo qualquer discriminação, direito fundamental, previsto na CF/88. Entretanto aos que se fazem contrários a lei, consideram está uma verdadeira aberração, pois de acordo com estes é inconcebível que uma pessoa que mesmo tendo idade civil, tenha mentalidade inferior a apresentada consiga manifestar seu desejo em casar ou de assumir os atos do casamento, pois os mesmos passam a ter plena capacidade, podendo além de casar, constituir união estável e exercer guarda e tutela de outrem. Isso vem afirmado explicitamente no art. 6º da nova lei13.146/2015.

De acordo com Pontes de Miranda (2012, p. 315),

O eixo do sistema de capacidade de fato (ou de agir) da pessoa natural é a cognoscibilidade e a autodeterminação, de forma que é plenamente capaz para os atos da vida civil aquele que compreende e se autodetermina, e que, portanto, tem pleno poder de gerenciar sua vida, seus negócios e seus bens. O discernimento está à base desse instituto.

Seguindo a mesma linha de pensamento Chinellato (2015, p. 35), afirma

Aquele que não compreende e nem se autodetermina precisa ser rigorosamente protegido, e até mesmo de si próprio. O código civil volta a atenção, assim, para esses indivíduos que, por variadas causas, não têm discernimento ou aptidão para a manifestação de vontade, e devem interagir socialmente em igualdade de condições por meio de representação e/ou assistência. Assim, ao absolutamente incapaz, por não ser apto aos atos da vida civil, dá-se representante, que fala, age e quer pelo seu representado. Ao relativamente incapaz confere-se assistente, e ambos praticam em conjunto os atos jurídicos.

Diante dessa imparcialidade é notório a dificuldade em avalia-la, porém é fato que a mesma foi criada com o intuito de assegurar a dignidade do portador de deficiência, para tanto promoveu alterações à artigos do Código Civil que refletem diretamente em alguns institutos do direito de família.


REVISÃO DE LITERATURA

Determinada como Síndrome de Down ou Trissomia do cromossomo 21, trata-se de um distúrbio genético, que acarreta dificuldades de habilidade cognitiva e desenvolvimento físico, todavia não é considerada uma doença. Dados estatísticos informam que no Brasil, tem-se mais de 300 mil pessoas com esta patologia, número expressivo e que somados a outros casos de deficiência asseguraram a preocupação do legislador em criar uma norma que assegura-se seus direitos, com isso foi estabelecido a Lei 13.146/15, que é conhecida como Estatuto da Pessoa com Deficiência (FBASD, 2016).

Antes de tecer especificamente sobre este instituto é preciso entender alguns requisitos acerca da capacidade civil do portador de Síndrome de Down, o qual perante a lei brasileira, mesmo sendo maior de idade, é considerado relativamente incapaz de exercer pessoalmente os atos da vida civil. No artigo4º, inciso III do Código Civil, são considerados incapazes, relativamente a certos atos, ou à maneira de exercê-los, “os excepcionais, sem desenvolvimento mental completo” (RODRIGUES, 2012).

O artigo 1.767, inciso IV do Código Civil, dispõe que estão sujeitos a curatela “os excepcionais sem completo desenvolvimento mental”. Curatela, conforme ensinamento de Washington de Barros Monteiro, na obra Curso de Direito Civil – Direito de Família, volume II: “É o encargo deferido por lei a alguém para reger a pessoa e administrar os bens de outrem, que não pode fazê-lo por si mesmo” (YASSIM, 2014).

A síndrome de Down de acordo com o ordenamento jurídico brasileiro acarreta a interdição deverá ser parcial, vez que se trata de incapacidade relativa e não total, sendo assim o art. 1.768 do CC prevê que o mesmo seja interditado parcialmente sendo promovida pelos pais ou tutores, pelo cônjuge ou por qualquer parente, ou pelo Ministério Público (promotor de Justiça) (RIBEIRO, 2015).

Cabe aqui uma pequena ressalva, os responsáveis por essa patologia, não são obrigados a interdita-lo, pois está só se torna efetiva em especifico para alguns atos praticados pelo filho interditado, sem representação do pai ou mãe (curadores) não sejam considerados nulos, tais como alienação de bens em nome do filho incapaz, etc (YASSIM, 2014).

Para vislumbrar como o novo instituto funciona, é primordial entender o conceito de capacidade civil e de interdição dentro do ordenamento jurídico brasileiro. O primeiro passo a saber é que os doutos legisladores dividiu a capacidade civil em direito e de fato, ou seja, a primeira, atributo de toda e qualquer pessoa e a segunda, também chamada de capacidade de exercício, uma condição especial só adquirida quando o ser humano atinge uma determinada idade em um dado estado de saúde física e mental (ARAÚJO e ARAÚJO, 2014).

Segundo as lições de Venosa (2003, p. 148):

A capacidade jurídica, aquela delineada no art. 2º, e no art. 1º do novo diploma, todos possuem, é a chamada capacidade de direito. Nem todos os homens, porém, são detentores da capacidade de fato. Essa capacidade de fato ou de exercício é a aptidão para pessoalmente o indivíduo adquirir direitos e contrair obrigações.

A legislação civil brasileira ocupou-se, portanto, em definir a capacidade de exercício ou de fato utilizando-se do chamado critério biopsicológico. Neste diapasão, a depender da aptidão de cada indivíduo para compreender os atos da vida civil e de exercê-los de forma consciente, como fruto de sua máxima expressão de vontade, é que podemos enquadrá-los como absolutamente capazes, absolutamente incapazes ou relativamente capazes (ARAÚJO e ARAÚJO, 2014).

Avaliando em paralelo com o novo Estatuto a pessoa com deficiência, é definida aquela que tem impedimento de longo prazo, de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, nos termos do art. 2º, não deve ser mais tecnicamente considerada civilmente incapaz, na medida em que os arts. 6º e 84, do mesmo diploma, deixam claro que a deficiência não afeta a plena capacidade civil da pessoa:

Art. 6o. A deficiência não afeta a plena capacidade civil da pessoa, inclusive para:

I - casar-se e constituir união estável;

II - exercer direitos sexuais e reprodutivos;

III - exercer o direito de decidir sobre o número de filhos e de ter acesso a informações adequadas sobre reprodução e planejamento familiar;

IV - conservar sua fertilidade, sendo vedada a esterilização compulsória;

V - exercer o direito à família e à convivência familiar e comunitária; e

VI - exercer o direito à guarda, à tutela, à curatela e à adoção, como adotante ou adotando, em igualdade de oportunidades com as demais pessoas.

Art. 84. A pessoa com deficiência tem assegurado o direito ao exercício de sua capacidade legal em igualdade de condições com as demais pessoas.

Segundo Lôbo (2015), esse último dispositivo é de clareza meridiana: a pessoa com deficiência é legalmente capaz, ainda que pessoalmente não exerça os direitos postos à sua disposição.

Inicia-se aqui as divergências, pois alguns acreditam que se criou um novo conceito de capacidade, paralelo àquele previsto no art. 2º do Código Civil, enquanto que outros não vislumbram um novo conceito, acreditam que este foi apenas modificado e ampliado.

E seguindo essa linha de reestruturação, verifica-se que os arts. 3º e 4º do CC, tiveram seus incisos revogados ou alterados. O art. 3º manteve apenas a hipótese de incapacidade absoluta, a do menor impúbere (menor de 16 anos), pois todos os seus outros incisos foram revogados. No caso do art. 4º, que trata da incapacidade relativa, também sofreu modificação. No inciso I, permaneceu a previsão dos menores púberes (entre 16 anos completos e 18 anos incompletos); o inciso II, por sua vez, suprimiu a menção à deficiência mental, referindo, apenas, “os ébrios habituais e os viciados em tóxico”; o inciso III, que albergava “o excepcional sem desenvolvimento mental completo”, passou a tratar, apenas, das pessoas que, "por causa transitória ou permanente, não possam exprimir a sua vontade"; por fim, permaneceu a previsão da incapacidade do pródigo (STOLZE, 2016).

Outra divergência presenciada pelo novo instituto, refere-se à classificação do incapaz, encontra-se uma dificuldade mediante as previsões do art. 3º e 4º, pois em determinado momento são considerados absolutamente incapazes, ora dentre aqueles considerados relativamente incapazes, todavia é necessário entender que são diversas as doenças mentais existentes e a forma como elas atinge a capacidade do ser humano, principalmente o que tange seus estágios de consciência (TARTUCE, 2015).

Creio que devido a essa inúmera gama de doenças mentais o legislador brasileiro encontrou imensa dificuldade em situar a norma, deixando-a para diversas interpretações.

Para Pereira (2016),

Em verdade, o que o Estatuto pretendeu foi homenageando o princípio da dignidade da pessoa humana, fazer com que a pessoa com deficiência deixasse de ser “rotulada"como incapaz, para ser considerada - em uma perspectiva constitucional isonômica - dotada de plena capacidade legal, ainda que haja a necessidade de adoção de institutos assistenciais específicos, como a tomada de decisão apoiada e, extraordinariamente, a curatela, para a prática de atos na vida civil.

Tais afirmações remete a pensar no fim da interdição, entretanto é preciso tomar cuidado e ser extremamente rigoroso ao avaliar tal situação, pois na medida em que o Estatuto é expresso ao afirmar que a curatela é extraordinária e restrita a atos de conteúdo patrimonial ou econômico, desaparece a figura da"interdição completa"e do"curador todo-poderoso e com poderes indefinidos, gerais e ilimitados"(STOLZE, 2016).

Todavia é preciso entender que a interdição (ou de curatela) continuará existindo, mesmo que analisada sob uma nova visão (TARTUCE, 2016). E que a mesma foi limitada aos atos de conteúdo econômico ou patrimonial (PEREIRA, 2016).

Segundo Abreu (2015),

É o fim, portanto, não do"procedimento de interdição”, mas sim, do standardtradicional da interdição, em virtude do fenômeno da “flexibilização da curatela”, anunciado por Célia Barbosa Abreu. Vale dizer, a curatela estará mais “personalizada”, ajustada à efetiva necessidade daquele que se pretende proteger.

É primordial que analise minuciosamente tal instituto, sempre em paralelo com o CC, bem como, com o novo Código de Processo Civil, para que não haja falhas quanto a sua aplicação. Reside nessa questão outra divergência, pois a Lei 13.146/15 atinge diversos Estatutos do novo código. Como exemplo o artigo do Código Civil que trata da legitimidade para promover a interdição (art. 1.768), revogado pelo art. 747 do CPC-15.

O Estatuto da Pessoa com Deficiência, por seu turno, ignorando a revogação do dispositivo pelo novo CPC, segundo Didier Junior (2015), acrescentou-lhe um novo inciso (art. 1.768, IV, CC), para permitir que a própria pessoa instaure o procedimento de curatela. Certamente, a conclusão a se chegar é no sentido de que o art. 747 do CPC vigorará com este novo inciso.

No quadro abaixo é possível vislumbrar a aplicação do Estatuto e as mudanças trazidas para o Código Civil e ao novo Código de Processo Civil.

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